“Positividade demais também faz mal ao ambiente de trabalho”

positividade tóxica

“Vamos manter o bom clima!”, “Aqui, a regra é pensar positivo!”, “Nada de reclamações, ok?” — expressões como essas parecem inofensivas, mas, quando viram regra, podem transformar o ambiente de trabalho em um espaço onde as emoções reais são silenciadas.

A chamada “positividade tóxica” vem disfarçada de incentivo, mas esconde um risco: o de criar equipes que fingem estar bem o tempo todo, mesmo quando estão sob pressão, frustradas ou esgotadas. E isso, no longo prazo, compromete a saúde emocional, a autenticidade das relações e até a produtividade.

Ser emocionalmente inteligente não significa ser feliz o tempo todo, e muito menos esconder o que sente. Significa reconhecer as próprias emoções, compreendê-las e saber como expressá-las de modo construtivo; algo bem diferente da negação constante dos sentimentos.

Quando o “tudo bem” deixa de ser verdadeiro

No ambiente corporativo, há uma expectativa implícita de manter uma postura positiva diante de qualquer desafio. É claro que otimismo é importante, especialmente em momentos de crise, mas nem todo desconforto precisa ser abafado.
Quando a cultura organizacional valoriza apenas quem “mantém o sorriso”, os profissionais começam a reprimir emoções legítimas, como tristeza, medo ou frustração.

O resultado é um clima de autocensura emocional. As pessoas passam a temer serem vistas como “negativas” ou “problemáticas” e deixam de compartilhar percepções que poderiam melhorar processos ou relações.
Essa dinâmica cria um paradoxo: o ambiente parece tranquilo, mas, por baixo, há insatisfação, ansiedade e desmotivação.

Controle emocional não é repressão

Muitos confundem controle emocional com repressão emocional.
Controlar é reconhecer o que se sente e escolher o melhor momento e forma de expressar. Reprimir é fingir que não há nada ali.
E, quando as emoções são reprimidas continuamente, elas acabam se manifestando de maneiras menos saudáveis como irritação, cinismo, sarcasmo ou até o afastamento emocional.

A inteligência emocional, portanto, não se trata de eliminar o negativo, mas de integrá-lo à experiência humana de forma equilibrada.
Saber nomear o que se sente é o primeiro passo para lidar com isso de maneira madura.
Negar o sentimento é o caminho mais curto para o esgotamento.

A cultura da “boa energia” e o medo de parecer fraco

Há empresas que, com boas intenções, acabam cultivando um modelo de positividade artificial.
Reuniões começam com frases como “vamos manter o astral lá em cima” mesmo quando há uma crise evidente.
Nessas situações, o que deveria ser um incentivo à motivação vira uma barreira à sinceridade.

O medo de parecer “fraco” ou “pessimista” faz com que muitos profissionais usem máscaras emocionais. O problema é que equipes assim não aprendem a lidar com erros, porque não há espaço para vulnerabilidade nem para conversas difíceis.
A “boa energia” constante pode até manter as aparências, mas afasta a confiança genuína.

Comunicação emocionalmente madura: a saída para o equilíbrio

Um ambiente emocionalmente saudável não é aquele onde todos estão felizes o tempo inteiro, mas aquele onde as pessoas podem se expressar com segurança e respeito.
Falar sobre um problema de forma construtiva é mais saudável do que fingir que ele não existe.
E é aí que a comunicação emocionalmente madura faz toda a diferença.

Profissionais e líderes emocionalmente inteligentes criam espaço para conversas autênticas.
Eles validam o sentimento do outro (“Entendo que essa situação te deixou frustrado”) antes de propor uma solução.
Essa validação não resolve o problema em si, mas restaura o senso de pertencimento e respeito que são dois pilares essenciais para a cooperação.

cooperação

O impacto do falso otimismo nas relações de trabalho

Quando o otimismo vira obrigação, ele mina a confiança.
Colegas deixam de compartilhar dificuldades por medo de julgamento e começam a atuar em modo automático, evitando se expor.
A criatividade e a inovação diminuem, porque ninguém quer correr o risco de ser o “mensageiro das más notícias”.

Além disso, gestores que ignoram sinais de insatisfação em nome do “pensamento positivo” acabam perdendo oportunidades de resolver conflitos antes que eles cresçam.
O falso otimismo, portanto, não fortalece a equipe — ele enfraquece os vínculos e gera desconexão emocional.

Como equilibrar emoção e profissionalismo

O equilíbrio está em reconhecer que nem toda emoção precisa ser compartilhada no calor do momento, mas nenhuma deve ser negada indefinidamente.
Profissionais maduros sabem escolher como e quando expressar o que sentem — não por medo, mas por consciência.

Algumas estratégias simples ajudam:

  • Nomeie a emoção antes de agir. Isso reduz o impulso e aumenta a clareza.
  • Compartilhe percepções em contextos adequados. Uma reunião de feedback, por exemplo, é um espaço legítimo para falar sobre desconfortos.
  • Evite generalizações. Fale de comportamentos e situações específicas, não de pessoas.
  • Dê espaço para o outro. Ouvir é tão importante quanto expressar.

Essas atitudes mantêm a autenticidade sem comprometer a imagem profissional.

O papel da liderança nesse processo

Líderes têm um papel central na construção de um ambiente emocionalmente equilibrado.
Quando demonstram vulnerabilidade — sem perder a postura —, enviam uma mensagem poderosa: a humanidade é bem-vinda aqui.
Isso abre espaço para que os outros também sejam sinceros, sem medo de punição ou julgamento.

Liderar com inteligência emocional é mais do que inspirar; é criar uma cultura onde todos se sintam à vontade para ser reais.
E, paradoxalmente, é essa autenticidade que torna as equipes mais fortes e resilientes diante dos desafios.

Conclusão: autenticidade também é competência

No trabalho, positividade tem valor — mas autenticidade tem poder.
Fingir equilíbrio não é o mesmo que cultivar inteligência emocional.
O verdadeiro profissional maduro é aquele que sabe manter a serenidade sem negar o que sente, e que entende que emoção também é informação.

Ser emocionalmente inteligente não é eliminar as sombras, e sim aprender a iluminar o que está nelas.
Porque só quando nos permitimos sentir é que conseguimos, de fato, evoluir como pessoas e como profissionais.

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